A importância de conhecer os diferentes patamares de Rendimento do Ciclista

Actualmente, dispomos no Ciclismo de tecnologias cada vez mais avançadas e precisas que permitem conhecer com exactidão as capacidades físicas e principais debilidades de cada atleta.

O caso mais pragmático desta evolução é o estudo do “binário” de cada ciclista, traduzido pela relação peso/potência a intensidades máximas e sub-máximas.

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O mundo velocipédico internacional tem dado cada vez mais importância a estes indicadores e, exemplo disso são alguns atletas nacionais que têm ingressado em equipas UCI tendo por base os seus portfólios centrados nas avaliações, que descriminam as potencialidades próprias e evidenciam com rigor o seu potencial desportivo.

Sendo esta uma temática actual e com um crescente número de interessados sobre o assunto, apraz-me desenvolver esta reflexão que considero cada vez mais determinante para a evolução da modalidade.

Neste sentido, é através das avaliações físicas de controlo do treino que conseguimos determinar os níveis de performance para as diferentes intensidades em que se baseia todo o processo de treino, tendo por base a potência. Refiro-me nomeadamente à determinação dos limiares aeróbio, anaeróbio e potência máxima. O conhecimento destes valores permite a atletas e treinadores identificar as principais debilidades físicas e, perspectivar com detalhe o caminho a seguir, tendo como objectivo a evolução fisiológica do atleta.

O aumento número de publicações científicas com estudos realizados em Ciclismo de Estrada e também BTT, possibilitam a comparação com valores de referência de atletas de TOP internacional, e assim “catalogar” com rigor os patamares de cada atleta.

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A relação peso/potência

Sendo algo já abordado num dos meus últimos artigos, não é demais voltar a evidenciar que a potência a que cada ciclista atinge cada um dos patamares já enunciados, deve ser sempre relativizada ao peso corporal do mesmo.

Exemplo: entre atletas com igual potência no limiar anaeróbio, o atleta com maior rendimento será aquele que possui menor peso corporal.

Damos especial ênfase ao limiar anaeróbio, uma vez que caracteriza o ritmo de rendimento desportivo das reais capacidades de cada atleta, em modalidades desportivas de resistência, como é o caso do Ciclismo.

Actualmente, cada atleta consegue definir rigorosamente os patamares a alcançar para ambicionar as melhores prestações desportivas. A elaboração de escalas de evolução para os atletas, permite aos mesmos terem um termo de comparação com ciclistas de elite nacional e internacional, e com isso perspectivar as suas reais ambições e a sua “janela” de evolução fisiológica. É por isso mesmo que, cada vez mais a linguagem comum entre atletas da modalidade baseia-se no rácio da potência, levando a que hoje em dia se treine preferencialmente com base na potencia, em detrimento de outros indicadores da intensidade do treino, como é o caso da frequência cardíaca, que apesar de ser sempre um valor válido, é ao mesmo tempo extremamente influenciável por factores externos, que podem acabar por influenciar uma correta análise de um treino, série ou esforço específico.

Este factor tem-se revelado determinante no processo de treino e na motivação do Ciclista, uma vez que evita a monotonia e repetição sistemática de horas de treino a fio, sem objectivos concretos a alcançar num determinado período de tempo. Isto quando um atleta sai para treinar e tem intensidades a executar que são realmente mensuráveis ao segundo, e quando consegue por exemplo, fazer séries em intensidades próximas do seu objectivo de evolução, pela indicação direta da potencia de pedalada.

O trabalho com a potência, além de quase imperativo hoje em dia, possibilita uma multitude de combinações entre treinos que permite manter os níveis de empenho e ambição do atleta no seu expoente máximo.

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A importância de conhecer os diferentes ritmos de treino

Contudo, não importa unicamente conhecer o valor da potência ao limiar anaeróbio, visto que, durante a competição e treino o atleta oscila entre os vários ritmos fisiológicos, sendo a óptima sinergia entre eles que traduzirá um maior potencial competitivo.

Sendo assim, é também muito importante determinar a relação peso/potência ao limiar aeróbio e ao VO2máximo (consumo máximo de oxigénio – potência aeróbia máxima). Alguns treinadores dão também grande importância na planificação do treino à análise da força reactiva ou pico de potência. Todos estes dados permitem descriminar o nível de desenvolvimento da capacidade aeróbia, anaeróbia e aláctica (sem produção de lactato – caso de um sprint máximo de escassos segundos). A interligação e relação entre todos estes patamares, ajudam-nos a conduzir com mais precisão e assertividade o processo de treino e, avaliar a evolução de todos estes patamares.

Passo a descriminar cada um destes patamares de performance desportivo-motora.

 

Limiar aeróbio

Corresponde ao limite até ao qual se realiza o trabalho de resistência puramente aeróbio, onde a acumulação de ácido láctico a nível muscular é muito pouco significativa. Sendo por isso mesmo o ritmo de treino utilizado nos dias de recuperação e em treinos longos, cujo o objectivo é trabalhar com mais ênfase o metabolismo das gorduras e a eficiência mecânica do Ciclista.

Trata-se da base de todo o trabalho do atleta, pois um bom desenvolvimento deste metabolismo permite que o atleta consiga evoluir mais facilmente em intensidades superiores, pois a capacidade de recuperação e remoção dos metabolitos produzidos em esforço (ácido láctico) é mais eficiente.

Continuando a discriminar os diferentes ritmos de performance do atleta, e depois de analisar o limiar aeróbio, continuamos com todos os restantes.

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Limiar anaeróbio

É a intensidade de treino/competição a partir da qual um incremento diminuto na intensidade e/ou velocidade traduz num aumento exponencial da concentração de ácido láctico a nível muscular, impossibilitando ou limitando a capacidade do atleta manter essa intensidade, obrigando a baixar esse ritmo de forma a promover uma recuperação total ou parcial.

Trata-se do ritmo de treino mais importante e discriminatório nesta modalidade, visto que quanto maior for a taxa de produção de energia a esta intensidade (Watts) tanto mais rápidos nos tornamos. É a capacidade fisiológica onde a “magia” do treino tem um papel fulcral, em que a estruturação de trabalho de séries de média e longa duração conduz-nos para patamares competitivos mais elevados.

O treino do limiar anaeróbio caracteriza-se por séries que podem ter entre 6 e 30 minutos, ou por vezes mais, dependendo do momento da época e do objectivo definido com o atleta.

Na busca de uma evolução constante, deve-se procurar realizar avaliações regulares de controlo do limiar anaeróbio, de forma a podermos averiguar a eficácia do processo de treino e de o reajustar. Isto porque, as necessidades do nosso organismo variam ao longo da época em função do trabalho que for desenvolvido e dos objectivos definidos.

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VO2máx

Corresponde à força máxima que conseguimos desenvolver num esforço contínuo e gradual até à exaustão. Traduz em termos numéricos o nosso máximo, ou seja 100% daquilo que conseguimos produzir em termos de força ao pedalar. É a partir deste valor que todos os outros parâmetros são estudados, tal como iremos verificar mais adiante.

Em termos práticos, tem a ver com a intensidade produzida em esforços de curta a média duração e que culmina com a falência de energia para conseguir suportar este ritmo. Normalmente, este tipo de treino é realizado através de séries que podem ter uma duração entre 1 e 6 minutos.

 

Pico de Potência

É o expoente máximo da energia que podemos desenvolver ao pedalar, sendo o resultado de um sprint máximo com uma duração de 10 a 30 segundos, consoante a especialidade velocipédica do atleta. Tanto pode ser avaliado numa condição indoor (em rolos) como em estrada. O que importa “reter”, é o valor mais elevado de potência desenvolvida durante esse curto período de tempo. Tal como já fui referindo, traduz-se por um sprint que pode ser realizado no final de uma prova ou numa situação específica de corrida, com o intuito de ganhar terreno a um ou mais adversários.

No treino este trabalho é normalmente desenvolvido através de blocos de séries muito curtas com durações que podem oscilar entre os 10 e os 60 segundos.

 

Relação entre os diferentes patamares de esforço

Após a determinação de cada um dos 4 patamares de rendimento do Ciclista, é importante relacioná-los com a potência máxima e relativiza-los ao peso corporal. Após realizado esta relação, podem-se fazer comparações com dados avaliados em atletas de topo mundial, e perspectivar objectivos a curto e médio prazo.

Como já foi indicado, a potência máxima deve ser o ponto de partida para o estudo dos restantes patamares de rendimento, uma vez que esta corresponde a 100% da força que pode ser produzida pelo Ciclista.

Assim sendo, e começando pelo mais baixo, o limiar aeróbio (trabalho de resistência) normalmente ocorre entre os 50% e os 65% do valor da potência máxima. A seguir, surge-nos o limiar anaeróbio, que consoante o nível competitivo do Ciclista pode ocorrer entre os 75% e os 90%. De realçar que, este valor pode em alguns casos ser ligeiramente superior, havendo registo de atletas que atingem o Limiar anaeróbio perto dos 93% do máximo, o que traduz uma capacidade de tolerância ao esforço impressionante, só acessível a alguns predestinados e após muitas horas de trabalho específico.

O valor mais alto que podemos encontrar na avaliação será sempre o valor do pico de potência ou força reactiva, que normalmente poderá ocorrer entre os 200% e os 300% da potência máxima.

 

Comparação com atletas de referência

Na última fase de análise dos patamares de rendimento, deveremos comparar com valores de referência, principalmente no que respeita ao limiar anaeróbio e potência máxima. O valor de limiar anaeróbio para atletas de topo a nível nacional encontram-se acima dos 5Watts/Kg, sendo que para atletas de topo internacional, o valor é na ordem dos 6Watts/Kg. Para ambos os casos, os valores de referência de potência máxima, encontram-se acima dos 6Watts/kg e 7Watts/Kg, respectivamente.

De referir ainda, que os dados apresentados são para atletas masculinos de Estrada e BTT (Cross Country), sendo que em atletas femininos, os valores são em regra 10% inferiores aos referenciados para atletas do sexo masculino.

 

A importância de todos estes dados

A determinação e análise dos patamares de rendimento do Ciclista são de extrema importância nos dias que correm, uma vez que a maioria dos treinadores e equipas procuram discriminar e seleccionar os atletas com melhor perfil fisiológico. Juntando a este potencial a técnica e as capacidades individuais, procuram constituir equipas mais fortes, cometendo cada vez menos erros na contratação.

A aplicação deste método em Portugal é já uma realidade no panorama velocipédico nacional. Alguns atletas portugueses têm apresentado junto de equipas UCI, portfólios e books pessoais, onde além do tradicional currículo competitivo, vem já referenciado e com bastante ênfase o perfil fisiológico do atleta. Isto já permitiu que alguns atletas lusos ingressassem em equipas com enorme potencial, e com isso conseguirem o passaporte para um patamar competitivo mais alto.

 

Bons Treinos!

Tiago Aragão

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