A importância do treino de ginásio – reforço muscular – na preparação do ciclista

Na fase inicial da época desportiva é comum incluir este tipo de treino no planeamento semanal do atleta. Apesar de haver uma opinião comum acerca das vantagens da inclusão do reforço muscular na pré-época, existem algumas questões que subsistem entre treinadores e atletas que criam duvidas e que normalmente, por falta de informação, acaba-se por prescindir deste tipo de trabalho, ou de o mesmo ser mal monitorizado.

  • Será o treino de ginásio é bem direcionado?
  • Será corretamente prescrito e executado em função da modalidade desportiva em questão?
  • Deverá este reforço muscular ser exclusivo da pré-época?
  • Qual a abordagem mais indicada?

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O reforço muscular

O treino de força no ciclismo tem como principal objectivo desenvolver os grupos musculares de forma a elevar a sua força contráctil e com isso a sua eficiência mecânica. Este tipo de trabalho é muito comum nos ginásios e existem diferentes forma de o executar, variando sobretudo nos objectivos pretendidos: resistência, força, hipertrofia, etc.

Neste sentido, é importante averiguar ao certo o que pretendemos com o treino de ginásio do ciclista, visto que, um plano de treino genérico será de todo desaconselhado, pois será algo a realizar momentaneamente e sem grande transfer para a prática desportiva.

A gestão do esforço – o treino de ginásio se for realizado de uma forma generalizada e não direcionado para a modalidade, além de traduzir uma sobrecarga de treino para o atleta sem qualquer benefício para a sua evolução, será tempo desperdiçado e que poderia ser utilizado na optimização das capacidades individuais do ciclista. O ciclismo é uma modalidade que por si só requer logo à partida uma imensidão de horas de treino, pelo que, adicionar tempo de treino sem proveito físico notório, será na minha opinião, totalmente descabido.

Além disso, se o trabalho desenvolvido no ginásio não for especifico, será algo a abandonar precocemente e que não perdurará ao longo da época, por não acrescentar valor ao crescimento físico do atleta.

 

A direção do treino

O trabalho de reforço muscular deve ser desde a pré-época pensado e planeado de acordo com as necessidades mecânicas da modalidade desportiva em questão. Assim, desde a primeira fase de preparação física o treino desenvolvido será sempre direcionado de forma a proporcionar os melhores estímulos ao atleta, procurando que o mesmo potencialize ao máximo todos os seus recursos, pois nem só da capacidade cardiovascular depende o sucesso desportivo na modalidade.

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Assim, deve-se distinguir o regime de força geral do trem superior – braços, tronco e região abdominal – de um programa mais específico para os grupos musculares das coxas, gluteos e pernas. Estes últimos, têm uma maior necessidade contráctil, por desenvolverem um mesmo gesto biomecânico que se repete milhares de vezes em cada treino. Neste sentido, ao invés de um treino geral em que as repetições podem variar entre 10 e 15 repetições (por exemplo), para estes grupos, cada bloco das diferentes séries dever conter maioritariamente mais de 20 repetições – havendo situações em que podemos chegar às 40 ou mais repetições.

Esta situação, apesar de pouco habitual para o praticante habitual de musculação, começará a ter todo o sentido após decompor o gesto técnico da pedalada, e respectiva análise quantitativa do numero de vezes que o mesmo se repete a cada semana ou mês…

 

A especificidade do treino

Apesar de se referir que, o treino deve ser programado de forma diferente para o tronco/braços e membros inferiores, é necessário ser criterioso nos exercícios específicos a executar: isto porque nem todos os exercícios para as pernas têm um transfer direto para potenciação do acto de pedalar, e neste âmbito, devemos eleger aqueles que preconizarão melhores ganhos de força/potencia a aplicar à posteriori na prática desportiva.

Ao mesmo tempo, deve-se analisar a diferente combinação de exercícios para uma mesma sessão de treino, pois existem inúmeras possibilidades de conjugar movimentos numa mesma sessão no ginásio que em conjunto têm um transfer maior para garantir uma cada vez mais forte pedalada. Este focus e recurso ao ginásio como forma de potencialização da capacidade de gerar força pelo atleta é ainda muito pouco explorado e tem inúmeras vantagens e toda a lógica a sua colocação no âmbito do trabalho regular do atleta.

 

A postura

Um dos principais cuidados a ter aquando da execução de um plano de treino no ginásio, é a procura de manutenção de posturas corretas ao longo da realização de cada exercício. Apesar do espelho ser um parceiro por excelência, a supervisão de um profissional do desporto e educação física é de extrema importância, pois o mesmo tem noções claras acerca da colocação corporal e alinhamento de segmentos, tendo ao mesmo tempo a capacidade de adaptar cada exercício à fisionomia do atleta, quer seja pela própria execução do exercício, quer seja pela colocação do atleta para a realização do mesmo. Esta ultima situação tem maior preponderância no trabalho com ciclistas, por normalmente serem um tipo de população com tendência normal para posturas cifóticas acentuadas, necessitando de correções posturais mais vincadas e de um trabalho de reforço da zona dorsal, trapézio e romboides mais evidente, de forma a corrigir e evitar problemas futuros.

A questão postural tem um maior impacto e relevo quando falamos em treinos com o TRX e/ou bola, visto serem elementos desiquilibradores que requerem uma noção corporal avançada, sob prejuízo de uma má execução técnica poder acarretar prejuízos diretos para a eficácia do treino. A referencia a estes 2 equipamentos estende-se a muitos outros, que para o caso foram os escolhidos por serem muito usuais.

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O treino de ginásio e o ciclismo português

Apesar de estar mais que estudada a necessidade deste tipo de treino para o atleta nas diferentes modalidades desportivas, por cá, é ainda um domínio pouco abordado no panorama velocipédico nacional, muito por culpa de falsos mitos alimentados pela pouca formação e experiência especifica, que vão prevalecendo e deitando por terra algo que já é comum realizar-se noutros países mais evoluídos.

O ciclista português não realiza, evita ou faz apenas por ser pré-época o treino de ginásio, porque está normalmente mal informado e/ou porque quem supervisiona o seu treino não está devidamente habilitado a aconselhar corretamente acerca do que deve fazer neste domínio. É comum desaconselhar até o treino de ginásio porque o mesmo proporciona ganhos de peso significativos que serão prejudiciais para o atleta.

O ponto de partida para esta ultima afirmação tem algum sentido, mas, à medida que analisamos e decompomos o que procuramos no ciclista, verificamos que é totalmente descabida e sem qualquer significado: o ginásio apenas acarreta ganhos de peso significativos no caso do treino ser mal programado (treino especifico para a modalidade). Depois há a questão do perfil atlético do sujeito, em que, mais do que o peso e que o ginásio, temos a análise completa da evolução da relação peso-potência ao longo da época e com isso averiguar qual o peso ideal em termos de manutenção dos índices de potência sem prejuízo dos mesmos por redução da massa magra. Por último, existem atletas que têm inclusive inúmeras dificuldades em subir os seus índices de força, e é o reforço muscular que normalmente o ajuda a subir nas suas capacidades físicas.

 

O ginásio ao longo da época

Por uma questão de necessidade (pré-época), de comodidade (inverno e menor propensão a treinar à chuva/frio) e de cultura, a ida ao ginásio é normalmente confinada única e simplesmente à fase inicial da preparação velocipédica. Contudo, e após uma leitura atenta do que fui explanando, existem variadíssimos casos de atletas que ganhariam e muito com a manutenção de um programa de força ao longo da época desportiva. Podendo parecer uma afirmação um pouco descontextualizada em função do panorama nacional, é comum encontrar ciclistas que após uma fase inicial da época competitiva em que ganharam alguma forma desportiva, não conseguiram continuar a evoluir como outros que se vão distinguindo dos demais. Analisando o perfil de peso-potência ao longo dos meses, podemos facilmente identificar se houve uma estagnação notória da evolução da mesma, e com isso, partir para a elaboração de um plano de trabalho que deve ser organizado ao longo de toda a época, gerindo a dinâmica das cargas em função dos objectivos de treino e competitivos.

Assim, é usual verificarmos que atletas de alto nível competitivo recorrem cada vez com mais frequência a este tipo de treino ao longo de toda a sua preparação. Visto que, mais do que simplesmente preparar para a competição, hoje em dia o mediatismo competitivo leva-nos a uma cada vez mais refinada procura do treinar para ganhar. A meu ver bem, pois é da elevação das capacidades atléticas dos praticantes de todas as modalidades que depende e muito o mediatismo desportivo.

 

Exercícios funcionais

Sendo o ciclismo uma modalidade desportiva bastante estática do ponto de vista da mobilidade do tronco, o recurso a exercícios funcionais será sempre uma mais valia, desde que os mesmos sejam corretamente supervisionados na sua execução. Assim, deveremos procurar garantir uma mobilidade acrescida para os membros superiores e principalmente para a coluna vertebral, que é submetida a uma curvatura constante nos treinos. Esta mobilidade permitirá garantir a saúde e bem estar das costas do sujeito, bem como aumentar a sua capacidade elasticidade aquando da necessidade de realização de um movimento mais brusco.

 

Bons Treinos!

Tiago Aragão

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